segunda-feira, 29 de julho de 2013

O Protocolo PRICE



P= Protection ( proteção )
Como os mais atentos devem ter percebido, a única coisa que diferencia os dois protocolos é a letra “P”. Eu gosto de pensar que o item proteção seria uma forma “repouso dinâmico”, uma vez que no mundo real ninguém fica em casa com o pé pro alto repousando devido a uma entorse de tornozelo (a menos que a lesão tenha sido realmente incapacitante). A área lesada deve ser protegida contra lesões adicionais pelo uso de órteses ou outros dispositivos para imobilização. No caso de uma lesão envolvendo os membros inferiores, recomenda-se o uso muletas para permitir marcha sem descarga de peso. Vale ressaltar que as órteses imobilizadoras não se limitam aos membros inferiores, existem modelos para membros superiores e coluna.


R= Rest (repouso ou restrição de atividade)
Uma estrutura lesada sem repouso e submetida a movimentos e sobrecargas desnecessárias terá seu processo de recuperação atrasado. A recomendação de repouso em uma lesão aguda é importante por dois motivos. Primeiro para proteger os tecidos moles afetados de uma lesão adicional. Segundo, o repouso permite que o corpo se recomponha de forma mais eficiente. No caso de um atleta, recomenda-se evitar treinos e atividades desportivas que envolvam o segmento afetado. Neste momento algumas pessoas devem estar se perguntando: mas quanto tempo deve durar este repouso? Bem, não existe resposta matemática para isso. O tempo de repouso necessário varia de acordo com a gravidade da lesão, mas a maioria das lesões menores necessita de um repouso de 24 a 48 horas, aproximadamente.
I= ICE (gelo)Apesar de também causar anestesia, não estou falando da Smirnoff ! ! ! !
A aplicação de gelo após lesão aguda é uma medida universalmente aceita na prática clínica, apesar de não haver consenso na literatura científica quanto a modalidade ideal, a duração ou a frequência de aplicação do gelo. Os mecanismos de ação do gelo após lesão musculoesquelética ainda são um assunto controverso, mas de forma geral, podemos assumir que o gelo é capaz de diminuir a dor local por reduzir a condução nervosa, além disso, o resfriamento reduz o metabolismo local minimizando o grau de lesão celular secundária, influenciando assim a magnitude da resposta inflamatória. Esta resposta metabólica também está associada a redução do edema e dos espasmos musculares. Pois bem, dito isso nos resta o ponto mais importante: Qual a dosagem ideal? Neste ponto, eu baseio minha conduta em um trabalho publicado em 2006 no British Journal of Sports Medicine e referenciado na base de dados PEDro (pontuação 7 de 10), no qual bolsas de gelo foram aplicadas em pacientes com entorse de tornozelo por 10 minutos. A bolsa era então removida, deixando o tornozelo repousar em temperatura ambiente por mais 10 minutos, e após este período, a bolsa era reaplicada por mais 10 minutos. Esta sequência era repetida a cada duas horas. O resultado do estudo foi bem interessante e demonstrou ser seguro e efetivo.
quem quiser baixar o artigo basta acessar este link


C= Compression (compressão)
A aplicação de faixas elásticas auxilia na drenagem do edema. O propósito da compressão é reduzir a quantidade de espaço disponível para o edema, limitando assim o inchaço. A compressão pode ser utilizada tanto para prevenir o aparecimento do edema (como no caso das grávidas), quando para auxiliar na sua reabsorção (como no caso da lesão traumática). Algumas pessoas sentem dor devido a compressão. Se o paciente queixar-se de dor, que está sentindo pulsar, ou se simplesmente sente que a bandagem está muito apertada, é prudente remover a bandagem e reaplicá-la de forma um pouco mais frouxa.

Quem quiser aprender mais, tem uns vídeos no youtube muito legais sobre como aplicar a bandagem. Para ver a relação basta acessar este link (vale a pena)



E = Elevation (elevação)
Está bem estabelecido que a elevação de um segmento facilita a drenagem venosa do membro. Em outras palavras: elevar o membro afetado reduz o edema. O efeito fisiológico e mecânico da elevação faz com que ocorra urna redução na pressão hidrostática capilar e também uma redução na pressão de filtração capilar. Esta drenagem é mais eficaz quando a área lesada é levantado acima do nível do coração. Ex: Se o paciente sofreu uma lesão em antebraço, deve deitar-se e apoiar o braço sobre travesseiros de modo que a região lesionada fique mais alta que o tórax. Já que estamos falando de elevação, vale lembrar que deve-se elevar o segmento e manter as grandes articulações em discreta flexão ou em extensão, caso contrário, pode-se gerar estase venosa e linfática conseqüência de drenagem reduzida. 

Reconstrução do LCA com dupla banda

O ligamento cruzado anterior é formado por um tecido resistente  dentro da articulação do joelho, prendendo-se do fêmur até a  tíbia .O ligamento em si é feito de milhares de fibras individuais, que juntos formam o LCA. Algumas dessas fibras são organizadas em feixes distintos e o LCA normal tem dois feixes de fibras primárias.Estes dois feixes estão posicionados bem próximos e em alguns pacientes pode ser difícil de diferenciá-los . Mas sabemos que há dois feixes primários, um anteromedial e um posterolateral.
AM=antero-medial  PL= poster-lateral
A maioria das cirurgias de reconstrução do LCA é feita usando-se um único feixe de reconstrução .Assim, usamos um túnel no fêmur e um túnel na tíbia e inserimos o enxerto nestes túneis, fazendo uma corda única ligando o fêmur à tíbia.Na técnica da dupla banda , em vez de colocarmos apenas um enxerto maior, usamos doiis enxertos menores. Seriam então duas reconstruções ligamentares, uma para cada feixe.
Alguns estudos têm demonstrado algumas vantagens do duplo feixe de reconstrução do LCA .Esses estudos mostram uma função mais ‘normal’ do ligamento reconstruído após este duplo feixe .Mas como este é um procedimento novo,  os resultados a longo prazo ainda não estão totalmente disponíveis . É possível que este procedimento seja uma melhoria no padrão de reconstrução para LCA.  Mas também é possível que esses pacientes possam ter a mesma evolução ou uma  evolução até pior que a reconstrução tradicional . Ninguém ainda realmente sabe . O feixe duplo é tecnicamente mais difícil e há poucos cirurgiões com experiência nesta técnica cirúrgica.Além disso , os custos envolvidos nesta cirurgia são maiores e as chances de complicações também.

Quando a cirurgia deve ser feita

Exceto raríssimas exceções ,a cirurgia do LCA não é realizada em caráter de urgência , mas sim eletivamente . Até pouco tempo atrás , existia o medo de se fazer a reconstrução do LCA imediatamente após a sua ruptura , pois alguns trabalhos mostraram uma chance maior de fibrose (dificuldade para dobrar e esticar o joelho)  . No entanto , trabalhos mais recentes mostraram que se o pós-operatório for conduzido corretamente , não há um risco aumentado de fibrose , mesmo se fizermos a cirurgia dentro dos primeiros dias após o entorse .
A situação mais comum que encontramos é a de um esportista amador , que tem atividades profissionais e/ou escolares que devem ser levadas em conta . Assim , até que a data da cirurgia seja definida, costumo orientar uma fisioterapia pré-operatória para que no momento da cirurgia o joelho esteja " menos inflamado " e com um arco de movimento bom , o que facilitará a  recuperação posterior . 
Hoje também é comum os médicos e pacientes terem de esperar cerca de 15 dias ou mais  para conseguir autorização do procedimento junto às operadoras de saúde.
A cirurgia é agendada em um hospital ou clínica que disponha de um centro cirúrgico apropriado. O paciente normalmente interna no mesmo dia da cirurgia e deve estar em jejum de cerca de 8 horas . 
Qual o enxerto que será usado para reconstruir o ligamento cruzado ?
A reconstrução do ligamento cruzado anterior (LCA) pode ser feita com diferentes tipos de enxerto. Estes incluem tendão patelar, tendões flexores do joelho ( semitendíneo e grácil )  e tendão de cadáver (aloenxerto). Cada uma destas opções tem vantagens e desvantagens.
Quando o LCA se rompe , não é possível costurá-lo. Assim , na cirurgia , temos que remover o que restou dele e substituí-lo por um outro tecido , chamado de enxerto. Para inserirmos o enxerto na posição do LCA original, túneis são feitos no osso da canela (tíbia) e no osso da coxa (fêmur) e o enxerto é passado através destes túneis para reconstruir o ligamento. As opções mais usadas de enxerto são :
A)Tendão patelar
O tendão patelar é a estrutura na parte frontal do joelho que liga a patela (rótula) à (tíbia). Quando usamos um enxerto de tendão patelar , sua parte central ( 1 / 3 do tendão )  é removida (cerca de 9 ou 10 mm) juntamente com um bloco de osso da patela e da tíbia.
  • Vantagens: já foi o enxerto preferido quando a cirurgia do lca se popularizou na década de 90 , principalmente por se tratar de um enxerto forte , com bastante resistência .
  • Desvantagens: apesar de ser extremamente incomum , existe o risco de fratura de patela ou ruptura do tendão patelar após esta cirurgia. Além disso, o problema mais comum após esta cirurgia é a dor na parte da frente do joelho (“dor anterior do joelho”).Os pacientes podem também ter dor quando ajoelham.
B)Tendões flexores ( isquiotibiais )
Os músculos isquiotibiais são o grupo de músculos na parte posterior de sua coxa. Quando os tendões isquiotibiais são usados , dois dos tendões destes são removidos ( o semitendíneo e o grácil )  e “dobrados ” em conjunto para criar um novo LCA. Hoje são os preferidos dos cirurgiões de joelho.
  • Vantagens:  A incisão para retirar estes tendões é menor que a incisão para a retirada do tendão patelar.A dor no pós-operatório imediato costuma ser menor e a possibilidade de dor anterior no joelho também é menor .
  • Desvantagens: quando começamos a usar os tendões flexores , achávamos que poderiam ser menos resistentes que o enxerto do tendão patelar ou o próprio lca original , mas testes mecânicos comprovaram sua resistência quando usado num feixe quádruplo . A fixação do enxerto na tíbia e no fêmur também evolui e hoje é difícil de citar uma desvantagem do seu uso .
C) Aloenxerto (enxerto de cadáver)
O aloenxerto é mais comumente usado em pacientes com menor demanda, ou pacientes que estão passando por uma cirurgia de revisão de  de LCA (quando uma reconstrução do LCA falha).Estudos biomecânicos mostram que o aloenxerto não é tão forte como o tecido do próprio paciente (autólogo). Para muitos pacientes, no entanto, a força da reconstrução do LCA usando um aloenxerto é suficiente para suas demandas.
  • Vantagens: Realizando a cirurgia usando um aloenxerto permite a diminuição do tempo operatório, sem necessidade de remover o tecido do próprio paciente e temos também incisões menores e menos dor pós-operatória. Além disso, se o enxerto falhar, uma cirurgia de revisão poderá ser realizada com os enxertos tradicionais .
  • Desvantagens: Historicamente, esses enxertos eram de má qualidade e impunham um risco significativo de transmissão de doenças. Mais recentemente, as técnicas de preparo do enxerto têm melhorado e esses problemas diminuiram bastante. No entanto, o processo de preparação do enxerto (liofilização), mata as células vivas  e diminui a força do tecido. No Brasil , sua disponibilidade é muito restrita e o fator preço também dificulta sua utilização.
 D) Outros enxertos : menos frequentes , mas que podem ser utilizados : tendão de aquiles , tendão quadricipital.
Como fixar o enxerto na tíbia e no fêmur
Na parte final da cirurgia , quando o ligamento original já foi retirado , quando os túneis ósseos já foram confeccionados, entramos numa fase delicada e importante da cirurgia, que é quando fixamos o enxerto na tíbia e no fêmur .
O enxerto fica dentro de um túnel ósseo na tíbia e no fêmur e deve ficar fixo por dispositivos especiais até que ele "grude" ao osso . Assim , a fixação inicial é mecânica e com passar do tempo ela é biológica . Com o aperfeiçoamento tecnológico houve um maior número de dispositivos disponíveis para este fim , cabe ao médico escolher aquele que ele considera mais eficaz e também aquele com que ele se sente mais familiarizado para ter um bom resultado. 
Abaixo mostramos alguns destes dispositivos .

sábado, 27 de julho de 2013

Revisão de LCA

A Reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior vem se popularizando nas últimas décadas. Conforme cresce sua incidência, observa-se um aumento nas suas falhas. Os autores descrevem a etiologia das falhas e ressaltam a importância de se identificar onde e quando esta ocorreu, para que possa ser evitada. Quando a falha da Reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior é diagnosticada, a estabilidade do joelho deve ser restabelecida. A cirurgia de revisão da Reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior é um procedimento complexo, que requer um planejamento pré-operatório preciso com relação às opções de enxerto e reposicionamento dos túneis ósseos.


Falha da reconstrução do ligamento cruzado anterior acontece quando o joelho operado volta a apresentar sintomas de instabilidade. Esta instabilidade pode ocorrer nas atividades de vida diária ou na prática esportiva. Segundo Harner, além dos sintomas de instabilidade, o exame físico mostra sinais de aumento da frouxidão e alterações no teste artrométrico com KT-1000 (1). Noyesconsidera falha de reconstrução do LCA quando o teste com o artrômetro KT-2000 mostra um deslocamento maior de 5 mm comparado ao joelho contralateral (2).

A ocorrência de atrofibrose também deve ser considerada uma falha da cirurgia de reconstrução do LCA, pois a falta ou a dificuldade de movimento é extremamente incapacitante e sintomática para o paciente, mesmo em atividades de vida diária.


As causas da falha da reconstrução devem ser corretamente identificadas para que a abordagem terapêutica seja correta. Podemos classificar as falhas em diversos grupos (3):
1-     Falhas de técnica cirúrgica
2-     Falhas biológicas
3-     Falhas traumáticas

O objetivo do cirurgião na reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior é reproduzir a posição e a função do ligamento nativo da forma mais precisa possível. Para isso, deve-se conhecer a anatomia, a técnica cirúrgica e realizar um planejamento pré e pós-operatório para evitar a falha na reconstrução. Se esta ocorrer é preciso identificar sua causa, corrigir o posicionamento dos túneis ósseos se necessário e estar preparado para utilizar diferentes tipos de enxerto e métodos de fixação.
De acordo com a literatura a incidência de falha nas reconstruções do Ligamento Cruzado Anterior, varia de 3 a 22%(5)Fu acredita que a revisão pode ser considerada como procedimento de salvação com resultados limitados. A meta é proporcionar estabilidade funcional que permita o paciente retornar ao trabalho, atividades de vida diária e esportes recreacionais leves(12).
A revisão é uma cirurgia complexa. Não se deve criar falsa expectativa ao paciente. Uribe em uma análise de 54 pacientes submetidos a revisão do Ligamento Cruzado Anterior , observou que apenas 54% dos pacientes retornaram ao nível de atividade pré-lesão. Estes resultados são significantemente inferiores, aos resultados das reconstruções primarias, em que 95% dos pacientes retornaram ao mesmo nível de atividade pré-lesão(10).  Safran e Harner reportam que  70% dos pacientes submetidos a revisão retornaram ao nível de função pré lesão.
Apesar dos resultados das revisões não reproduzirem os resultados das  reconstruções primárias, a literatura recomenda que ela deva ser realizada para restaurar a estabilidade e função articular.